7 de novembro de 2021

Minha menina do Rio

Esquina de alguma viela do Rio de Janeiro, um sambinha tocando ao fundo, uma roupa alegre e leve feito chuva de verão no fim do dia, um batom estou-nem-aí: minha menina do Rio, que delícia te encontrar!

Não sei se deveria dizer isso assim, logo de cara, mas já ao te conhecer percebi que você não era de se preocupar muito com roupas e, como eu, sempre veste as mesmas coisas, o mesmo brinco pequeno e delicado, o mesmo coração gigante, como aquela montanha de bagunça feita de trapos que você junta em um canto do seu quarto antes de sair de casa. Existe coisa mais linda que um coração feito de trapos? Um coração vivido, com alegrias e traumas que sobraram depois de amar, remendado de coisas que teriam tudo para ser e não foram.

Sem perguntar se podia, eu me apaixonei ao esbarrar em você, enquanto bebia uma cerveja naqueles copos de bar, em um boteco daqueles em que a gente nunca imagina que um dia vai entrar para beber algo e comer o pastel que eles dizem ser o melhor da casa. Eu sei que se apaixonar sem nenhum critério além do que manda o olhar e o pulsar do peito é coisa de gente louca, mas, graças a Deus, sei também que estou em plena harmonia das minhas funções, e sem dúvida não me importo em parecer insano, maluco, pirado feito cata-vento, desde que eu nunca perca a capacidade de deixar meu coração agir feito um completo idiota.

Quando vejo você vir caminhando, do jeitinho que sempre lembro, deixo o vento furtar todos os meus problemas. Não seria justo beijar você com algumas dúvidas na cabeça, não seria meu melhor beijo. Beijar você é um toque que faz contas na intimidade, que envolve carinho e uma canção da qual já compramos todos os direitos emocionais. Cantar pensando em você é uma brincadeira gostosa demais para não fazer com toda a verdade que há. Como alguém consegue amar sem cantar o que sente para quem diz que tanto ama? Cantar para quem se ama, sem desculpinhas de afinação e ritmo, é um presente sem embrulho, é deixar o interior gritar: “Ei, esse sou eu, eu te amo, me deixa cantar, me deixa vadiar e ser feliz declamando versos que não escrevi, mas traduzem tanto o que eu quero dizer.” E eu canto e não perco essa parcela linda do amor!

Minha menina do Rio, falo sobre você comigo mesmo todas as manhãs. E quando você, no fim de tarde, se avizinha de mansinho no meu colo, tenho vontade de sumir. Sim, porque, quando estou muito feliz, fico com medo de tudo acabar sem aviso, de ser breve demais para eu não saber lidar com sua falta, com receio de nunca mais sentir essa coisa que me dá tanta alegria e vontade de viver. Quero esquecer que amanhã preciso viajar de novo, que amanhã de beijo só haverá distância. Por favor, a gente não pode se esquecer, como nos esquecemos de tirar a roupa para dormir quando chegamos cansados, mortos, do trabalho.

Então, antes de eu ir, dança um samba comigo? Mesmo eu não tendo destreza nem para lavar um talher sem me molhar por inteiro, seria tão gostoso aprender a dançar com você. Me ensina? É dois pra lá, dois pra cá, feito meu coração quando te vê me buscando no aeroporto? Eu não sei dançar, mas me deixa tentar. A tia Eulália ficaria muito feliz. Que delícia pegar na sua cintura enquanto a gente desliza e eu posso te lançar aquele olhar safado e doce, igual a um encontro de almas, sei lá, essas coisas que a gente faz quando ama, rodopia e dança uma música que fala tanto sobre nós.

Menina, vou demorar um pouco para voltar, mas reserve seus próximos meses para mim, para beber uma cerveja comigo na mureta da Urca? A gente pode deixar uma plaquinha com nosso nome por lá até eu voltar. Será que eles guardam um pedacinho da mureta só para nós? Sei lá, a gente conta para eles que a gente se ama... deve ser o suficiente. É, eu não sei quando vou ver você de novo, nem quando meu coração vai pular igual carnaval ao seu lado. Todo voo é uma nova despedida, mas sempre vou me lembrar do dia em que você me perguntou o que sinto por você. Não surgiram palavras, no máximo alguma onomatopeia composta por suspiro e riso. Tentar explicar o que sentimos, quando nós mesmos nem sabemos, é algo muito grande para ter alguma resposta coerente.

Agora eu preciso ir, menina! Meu avião chegou. Poltrona 17B. Odeio sentar no meio, odeio turbulência, odeio lanchinho de voo e odeio ficar longe de você. Coisa minha. Antes de ir, só me deixa explicar uma coisinha... Sabe por que tanto chamo você de menina? Porque de mulher já basta seu olhar, seu beijo e o tamanho da minha saudade. Então deixemos essa doçura e essa leveza para o seu nome, para quando eu quiser gritar para você antes de partir para a próxima viagem.

Um último beijo, minha menina do Rio. Já estou com saudades!

31 de outubro de 2021

Por que me culpo por me fazer bem?

Por que me puno tanto por tomar decisões, se depois elas se mostram certas? Por que me julgo cruel por ter atitudes que eu sei que vão me fazer bem? Por que me boicoto em ocasiões que são lindas oportunidades de amadurecer

Esses foram questionamentos que me fiz antes de dormir, em um diálogo que só aconteceu na minha cabeça. Adormeci com a imagem de um enorme e severo juiz, e ele tinha o meu rosto.

Naquela noite, tentei compreender como conseguia perdoar os outros com mais facilidade do que perdoava a mim mesmo. Observei como, muitas vezes, a punição que eu me impunha era maior do que o próprio delito. Seria essa a maior injustiça que podemos cometer contra nós mesmos? Dizer que amamos os outros, mas nem sequer tirarmos um tempo para nos amar? Por que temos um olhar tão condescendente com os outros enquanto somos tão críticos com nós mesmos? Na escuridão do quarto, essas perguntas surgiram como uma fresta de luz pela janela.

Muitas vezes me perdi em culpas que nunca foram minhas. Me coloquei em situações naufragadas por um mar de empatia com o outro, mas sem uma gota de compaixão por mim mesmo. Por outro lado, se o olhar empático para o mundo é tão necessário, por que o mesmo olhar voltado para si não seria? Se eu pudesse sorrir para mim da forma como sorrio para os outros, se eu pudesse dar a mim mesmo o carinho que dou aos outros, se eu pudesse ser comigo o que tanto insisto em ser para os outros, talvez conseguisse dormir sem me punir tanto por tomar decisões necessárias.

24 de outubro de 2021

Onde estão as pessoas interessantes?

Há cansaço em toda parte. Em todas as esquinas existem pessoas cansadas buscando alívio e compreensão em pessoas que também estão cansadas de não serem compreendidas e amadas. Dizem, inteiramente cansadas de conversas protocolares e respostas prontas, que as pessoas interessantes devem ter ido morar em algum lugar bucólico, arborizado, com poucos seguidores e – claro! – o Instagram fechado.

As pessoas ainda sabem conversar? Onde os arrepios se esconderam? Por que o amor não é mais como no tempo dos meus avós? Onde estão as pessoas interessantes como eu? – perguntam os cansados em tom de indignação e sapiência.

Aos cansados, respondo: o que não falta neste mundo são pessoas interessantes. Encontro elas todos os dias. Em todos os lugares. Talvez elas não sejam tão descoladas como na sua imaginação, mas acredite; elas existem. Existem e são autênticas – e autenticidade não tem a ver somente com a cor do cabelo, mas também com o fato de se aceitar tedioso. Cientes da sua simplicidade, pessoas interessantes caminham calmamente por aí, silenciosas e bem resolvidas com as suas imperfeições. Até porque pessoas interessantes sempre carregam uma mochila de imperfeições consigo.

Se as conversas lhe parecem todas iguais, por que você não faz perguntas diferentes? Se ninguém do seu círculo compreende as tuas dores e aspirações, por que você não conta para outras pessoas? Se todos os que lhe batem a porta parecem pouco interessantes para você, por que você não nos ensina como sermos mais interessantes?

A falta de paciência que existe no amor atual, é reflexo da falta de paciência que carregamos diariamente conosco. Somos impacientes, por isso não amamos. Somos inconstantes e indecisos, por isso não amamos. E não ao contrário. As pessoas interessantes e dispostas a amar estão por aí aos montes, mas será que estamos tendo sensibilidade e paciência para percebê-las e nos conectar com elas?

A questão não é sobre querer amar acima de tudo, como uma utopia a ser realizada para sentir-se completo, mas sobre estar disposto a ter paciência para ver amor no comum, no tédio, na calma. É sobre disposição, não somente sobre o fogo das emoções. 

E a pergunta que fica é: será que você está tendo paciência para amar ou somente para ser amado?

17 de outubro de 2021

Apague a luz

Será que não está na hora de você ir embora? Dizer adeus, apagar a luz, juntar as suas coisas, todos elas, e se desprender de frustrações e situações que não pertencem a você? Por que você carrega, insistentemente, um fardo que os seus ombros – há anos tão leves e soltos – não conseguem mais sustentar?

Eu sei que ainda há amor, mas e daí?! Ninguém vive de amor quando não há respeito. Ninguém vive de amor se a felicidade, o sorriso verdadeiro, não surge há tempos. Aguardar a tempestade passar durante anos e anos para um dia, quem sabe, a possibilidade de sorrir novamente aparecer é uma maneira muito triste de levar a vida.

Eu sei que existem contratempos, mas eles não podem perdurar para sempre. É possível até que a tempestade já tenha findado e você, fechando os olhos para os sinais, não tenha percebido. Acontece que dizer adeus não é necessariamente afugentar a pessoa do nosso coração, mas colocá-la em outro grau de relevância. Eu sei que foi lindo, que houve verdade, e ainda há, e que as emoções do passado ainda são belíssimas, mas elas não podem sustentar por tempo indeterminado um presente tão frio, previsível e viciado em constantes reclamações.

Se sentir que deve, vá embora, não espere morrer por dentro para anunciar uma despedida, não se torture por ser o gatilho de um recomeço, apague a luz com a convicção de que relações que dão mais trabalho e desesperanças do que a solidão não são mais para você.

10 de outubro de 2021

Quem irá fazer por nós o que não conseguimos fazer?

De tempos em tempos precisamos nos reencontrar. Olhar para si e questionar se os nossos passos estão alinhados com o que o nosso coração pede. Será que ainda somos o que dizemos ser? Será que estamos aceitando o nosso destino? Será que estamos dando ouvidos aos pedidos do coração ou somente correndo freneticamente?

O nosso reencontro não deve ser com quem fomos, mas com quem precisamos ser. As memórias do que foi vivido alimentam a saudade, mas não matam a fome. Os bons momentos ficam em cômodos mais distantes, mas não somos mais a história que se passou naquela casa. 

Esse reencontro é sobre acolhimento e sobre aprender a se amar novamente com todas as imperfeições que nos dizem respeito. Amar o outro é tão mais fácil, pois aguardamos resgate. Queremos ser salvos! Quem irá nos trazer movimento? Quem irá nos aceitar antes de nós mesmos? Quem irá fazer por nós o que não conseguimos fazer?

Estar perdido dentro de si é uma dor que precisamos aprender a abraçar. Buscamos respostas concretas, mas sempre será sobre aceitar, seguir e acreditar. Não há garantia que pacifique o coração, não há certeza que possamos terceirizar. Sempre seremos o que sentimos, não o que dizemos ser. E hoje precisamos sentir mais por nós mesmos.

3 de outubro de 2021

Se ame e as coisas acontecerão

Todo mundo tem vários objetivos e sonhos na vida. Alguns gostariam de comprar uma belíssima casa, com um jardim cheio de pés de jabuticaba e uma piscina de borda infinita. Outros prefeririam ter um apartamento aconchegante, na esquina de um bairro gostoso e arborizado, até porque iriam viajar tanto que não teriam por que arcar com os custos de uma casa com pés de jabuticaba e piscina de borda infinita. Alguns desejariam casar com alguém que os amasse de verdade, independentemente do tempo que durasse, em uma cerimônia na praia, com roupas leves, poucos convidados e chinelos de dedos. Outros escolheriam o casamento em um lugar chiquérrimo, com convites sociais irrecusáveis e bebidas das quais nem sabemos o nome, cheias de lindas e enormes rosas modificadas geneticamente.

Alguns optariam por ter cachorros serelepes e babões, que fazem festa quando os donos chegam em casa. Outros teriam gatos, autossuficientes e carinhosos. Alguns sonhariam em empreender seus projetos de criança, com a liberdade que a alma pede. Outros, em ter um trabalho seguro e que não coabite com as instabilidades do eterno tiro no escuro que é arriscar em um negócio próprio.

De qualquer maneira, provavelmente o maior objetivo de todos nesta vida é conseguir se amar, independentemente das escolhas feitas e dos pés de jabuticaba.

Quando a gente se ama, as coisas acontecem. As pessoas e as oportunidades que se aproximam da gente também são diferentes e quase sempre oscilam em vibrações positivas. Eu sei que gostar verdadeiramente do que carregamos conosco, sem nos questionar e sem nos comparar, é algo dificílimo, ainda mais nos dias de hoje, em que a comparação é tão imediata. Mas não se engane: amar-se não é postar fotos nas redes sociais evidenciando para o mundo como você está bem. Amar-se é ter paz interior o suficiente para não precisar da aprovação dos outros.

Chega uma idade em que a gente precisa chacoalhar a árvore das amizades, dos amores e até das pessoas que seguimos nas redes sociais, para observar se elas ainda fazem sentido. Se ainda devem fazer parte da nossa vida ou se elas simplesmente já se desgarraram pelo chão. Livre-se das pessoas que não estão mais presas aos seus ramos atuais. Se as amizades do presente parecem não ter mais razão de ser, mas insistimos em sustentá-las com as lembranças do passado para se manterem vivas, significa que elas deixaram de ser amizades.

E, por favor, não deixe ninguém tirar ou diminuir a sua autoestima, mesmo que sem querer, mesmo que gostem de você. Em geral quem faz isso não percebe o que está causando e nos magoa com comentários leves ou brincadeiras inocentes. Converse com essas pessoas sobre isso ou afaste-se delas. Distanciar-se de quem emana energias que não combinam com a nossa é o primeiro passo para aprender a se valorizar e a dar prioridade ao que vem de dentro de nós.

Ame-se como você já amou alguém. Olhe-se com a admiração que você já olhou alguém. Sinta o mesmo por você e entregue-se com verdade e vontade de se abraçar eternamente. Ame-se. Faça isso e todas as coisas acontecerão.

19 de setembro de 2021

Por que não ficamos juntos?

Sempre me vi como um garoto bobo, sorridente, feliz, por minha alegria pessoal, que gosta de coisas simples e que raramente se importa com dinheiro – mesmo que minhas maiores paixões sejam viajar e comer. Sempre tive facilidade em ser feliz com pouco: um DVD antigo, uma notícia boa, um violão sem corda na casa de um amigo, um beijo estalado, um abraço de despedida, uma foto boba a dois no elevador.

Ela, luz no sorriso, estrela que brilha deitada no jardim, um presente que a gente guarda até o embrulho, no meu amor foi tubo de ensaio. Testou minhas alegrias e meus medos, até onde eu poderia ir e me jogar por amar alguém. Olhos pequenos, um coração feito melancia, doce, grande, mas com algumas sementinhas amargas – trauma que a gente tira ao amar.

Hoje me lembro dela e me deixo perfurar pelas lembranças que se instalam. Por mais que poucos acreditem, eu tinha um amor. Sem arrependimentos ou questionamentos tontos como “Valeu a pena?”, eu me perdi por ela, a envolvi no meu mundo, abri meus mapas e a deixei conquistar cada continente que havia por aqui. Nessa nossa viagem, alguns barcos afundaram, outros perderam o rumo, e alguns bons e poucos ainda sobrevivem dentro de mim.

O tempo passou e hoje não me pergunto mais por que ela não voltou ou se ainda sente saudade, mas sim por que não ficamos juntos. Onde foi que a gente deixou desandar algo tão bonito? Ou fui eu que errei e não percebi? Nunca sei o que responder. A gente combinava tanto: o beijo era primavera, o sexo era verão, e o carinho, um inverno sem fim.

Há algum tempo, voando alto nos clichês, falei que sem ela não conseguiria mais viver. Sem ela, infelizmente, não haveria paz dentro deste coração que toda noite chorava de mansinho. Por um bom tempo fiquei triste, perdido, sem rumo, desnorteado, desde o último adeus. Sem muitas opções, tive que me reerguer. Mesmo estando bem, depois de tanto tempo, há dias em que a saudade ainda aperta, sai pela boca, nos contorce entre as cobertas.

Dentro de mim ainda sinto, na loucura e no egoísmo, que talvez ninguém vá gostar dela como eu. Na verdade, para mim, o mais triste é ter consciência de que nossa história nunca teve fim. Foram vários e breves finais, tão sutis que nunca percebi em que momento a gente decidiu mudar de caminho. E, quando me perguntam o porquê de não termos ficado juntos, eu me calo e balanço a cabeça, como se estivesse pensando sobre isso há anos e, sem perceber, respondo: “Não sei.”

Dizer “não sei” quando se trata de amor é sempre uma resposta pobre. É uma dor que não se entende, uma aventura que não se vive. Mesmo lembrando com carinho da nossa história, eu não sei o que aconteceu, onde o tesão se escondeu, nem onde a gente disse adeus e esqueceu de se abraçar.

Amores feitos à mão não podem acabar com um sopro. Ou pelo menos não deveriam. A gente construiu tanta coisa, viveu tantas histórias que serão lindas de contar, e é difícil engolir a dúvida do que seria e não foi. Ela foi minha melhor notícia, um sorriso torto que endireitou o meu eixo cabeça-coração, um presente que desembrulhei e cujo papel guardei, na esperança de um dia servir para algo.

Embrulhos bonitos sempre merecem ser guardados. E eu guardei. Indiscutivelmente, continua sendo um papel muito bonito, cheio de desenhos e saudades, mas que ainda me faz questionar: Por que não ficamos juntos?

12 de setembro de 2021

Para que amar a saudade se a gente pode falar do amor de agora?

Ela sempre foi de sorrir muito, como se vivesse todos os dias em um eterno carrossel, cada volta um sorriso diferente a cada volta e um medo maior da próxima. Quando conversávamos, me contava que não conseguia dizer o que sentia para quem tanto amava. É engraçado porque, dentro dela, não havia sinais de vergonha ou medo da falta de aprovação. Mas quando alguém me diz que não sabe demonstrar o que sente, me soa como uma confissão, um pedido de ajuda. Quem fala isso é porque está sofrendo, mesmo que às vezes não saiba.

Ela pode ser João, Pedro, Carolina ou Juliana. Ela é o medo de sentir uma alegria que nunca sentiu, ou que sentiu e perdeu às vésperas de se tornar indelével. Ela é a vergonha de ser, como muitos dizem, vulnerável ao amor ou, em casos mais graves, uma conversa estreita entre o sentir e o orgulho de demonstrar, mesmo que ela não admita. Ela é um medo do tamanho do mar-profundo, uma conchaque, de tão fechada, ouve de todos que é durona, quando no fundo só tem pavor de perder a pérola que guarda em seu interior.

Quando dizemos, da maneira que for, nossos sentimentos para quem amamos, envolvemos aquela pessoa no nosso universo de modo único, englobando tudo o que há em nós: os afetos e os desafetos, os defeitos escondidos e os aparentes, as manias e as loucuras. Omitir do outro nossas peculiaridades seria uma maneira muito pobre de amar. Quando sentimos que, além de pulsar, o coração também formiga, queremos dividir com o mundo, gritar, olhar nos olhos e, sem medir a duração das palavras, transportar as formigas que ali vivem para também conhecer o coração do outro.

Poucos sabem, mas existe uma parcela da vida muito bonita que permeia o dizer e o sentir. Sentir é maravilhoso, criamos dentro de nós lugares que nunca imaginamos, profundos, ricos, nossos. Só que, quando confessamos o que sentimos, transportamos nossos amores para um tapete mágico que pode nos levar aonde quisermos. Ver a alegria de quem a gente ama estampada no rosto é um prazer muito maior do que “só” amar por amar. Ter a sensação de estar amando é algo pequenino perto da euforia de dizer ao outro que ele está sendo amado.

Ela ainda não descobriu como é divertido dizer, sem pudores, o que sente e, pela linda mania que a vida tem de distribuir seus momentos, ganhar em troca um sorriso de reciprocidade. É como um bom-dia com café quentinho e abraço com gosto de para sempre, mesmo que de eternas sejam só as lembranças. A verdade é que a gente perde muito tempo com medo, perde amores, sensações únicas, sorrisos únicos, por achar que não consegue. A gente se perde em saudades que, por sua vez, também serão únicas.

Querer ouvir tudo mas não falar tudo o que se sente é injusto tanto com os amores que passam quanto com os que ficam. Eu te amoeu adoro estar com vocêfoge comigoestou tão feliz que você está aquidesce rapidinhoestou com tanta saudade são palavras que soam feito bálsamo para a alma de quem convive conosco. Uma pena ela não saber disso e não se enfrentar para descobrir como é louco e gostoso esse mundo das palavras que soam feito música.

Sorria como ela, mas não deixe de dizer o que ela quis e não conseguiu. Seja diferente, e olha que nem precisa sair daquele carrossel cheio de alegrias em que ela vive, onde há espaço para todos os medos. Ela não sabe o que está perdendo, mesmo que já tenha perdido muitas coisas.

Ah, se ela soubesse como o tempo passa! Ah, se ela soubesse como a dor de não falar amarga a vida! Ah, se ela soubesse como as próximas voltas dão muito mais medo! Então, para que amar a saudade de um dia se a gente pode amar e falar do amor de agora?

6 de setembro de 2021

E se o amor que a gente espera nunca chegar?

De eventualidade surgem amores. E de amores surgem eventualidades. Terminam, somem e reaparecem como se pudessem brincar com o que a gente sente. E a gente sente tanto... E tendo somente a saudade do vivido como companhia, lembra com carinho o que já viveu, e com esperança o que ainda vamos viver. Não temos muitas opções além de ter esperança e sorrir à mercê do destino. Se é que ele existe.

Nesta noite, enquanto escrevo e tento evitar comer carboidratos antes de dormir, me pergunto como a vida seria se os dias continuassem assim, com amizades lindas, pequenas surpresas corriqueiras e sorrisos de canto de boca. Mas e sem um grande amor para dividir tudo isso? E se tivermos que nos contentar em viajar sozinhos, dormir sozinhos, esquentar nossos pés sozinhos, sonharmos com uma linda história de amor sozinhos? E se a gente tivesse que se acalmar sem ter ninguém que quisesse nos acompanhar pela tão triste e falsa eternidade?

A gente mata e revive o amor que há dentro de nós todo dia. Pensa em silêncio, pois não quer admitir como os outros conseguem viver amores tão febris, e a gente aqui, passando mais um dia em branco. Sem muito o que fazer, vemos um filme no domingo, trabalhamos um pouco mais na sexta-feira, tomamos um café com gosto de pressa na quarta-feira pela manhã e, entre momentos banais da vida, sentimos na pele a saudade de viver um amor que, como se fosse fácil, só nos fizesse sorrir.

Mesmo sendo cais das minhas dúvidas momentâneas, desconheço pessoas que terminaram a vida de forma feliz, convictas que desistir do amor seria uma solução pertinente. Acontece que o tempo passa e a gente fica. Pensando, esperando, vivendo feliz, mas na espera de algo mais. Alguém para dividir o mundo, acariciar a cabeça pelo amanhecer e sumir entre os cabelos desgrenhados antes de dormir. Alguém para abraçar o eterno, mesmo que ele seja ilusório. Para beijar a boca, mesmo que ela seja passageira. Para rir na tristeza, mesmo que ela seja somente nossa.

Sem respostas, mas com muitas convicções, a gente procura amores e, na maioria das vezes, encontra somente bocas. Procura corações e encontra somente olhares que, no fundo, buscam o mesmo que nós. Todos vivem em busca de um grande amor. Até aqueles que, por uma dureza claramente repleta de pânico, dizem que não precisam de amor para viver feliz. Ninguém é tão superior assim. Ninguém vive sozinho com tanta gente especial espalhada por aí.

Sendo a poesia o mais bonito dos sentidos, que o amor que a gente espera venha, mas não exatamente como imaginamos, e sim como merecemos. E que, por favor, que seja alguém que goste de viajar, pois no auge da minha loucura pessoal, confesso que já fiz alguns dos nossos roteiros. Garanto que você vai gostar. O pôr do sol tangerina de Florença é a sua cara.

29 de agosto de 2021

Se apega, sim

Um dia te disseram que você devia desapegar. Que devia se afastar dos sentimentos, dos amores e das pessoas que pudessem invadir sua privacidade emocional. Como se o desapego fosse um antídoto contra o sofrimento, como se isso transportasse as pessoas com más intenções para um universo distante e paralelo. Como se desapegar fosse a solução definitiva para os problemas de quem fez escolhas imperfeitas no amor. Mas como você vai amar com maturidade se fugir toda vez que o amor der as caras? Do que você quer tanto se proteger?

O pior é que vejo pessoas se colocando em um pedestal por não se apegarem, como se isso fosse um objetivo a ser alcançado, um superpoder. Triste. Como sempre digo, amar sem se colocar em uma situação de vulnerabilidade é impossível. E deixar de amar pelo eterno medo de sofrer é uma conduta pobre demais. Você tem que se desapegar das coisas que te fazem mal, mas não das emoções. Buscar autoestima, se proteger de situações que sugam seu amor-próprio, se resguardar depois de uma relação turbulenta, por exemplo, são atitudes inteligentes, diferentemente de cultivar o desapego e a falta de responsabilidade. A gente precisa aprender a se apegar, sim, só que precisa aprender a selecionar as pessoas em quem vamos depositar nossas esperanças.

Nunca deixe que te digam que desapegar é uma maneira de não sofrer. Na verdade, o desapego só posterga os aprendizados que amar outra pessoa traz. E é bom que você saiba desde já que os sofrimentos são inevitáveis; é preciso aprender a lidar com eles. Para receber um amor, além de estarmos abertos a amar, precisamos estar preparados para a hora do adeus. Achar que você pode driblar a dor de sofrer por amor é uma ilusão. Por isso, ouça mais o seu interior do que a opinião de pessoas que pouco sabem sobre amar.

Está com dificuldade de seguir em frente depois de uma relação que havia muito sentimento?

Quer dar a volta por cima e resgatar o seu bem-estar emocional?

Fred Elboni 2022 — Todos os direitos reservados

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