26 de abril de 2021

5 passos para ter mais autoaceitação

Na semana passada escrevi um pouco sobre o dilema entre mudar e se aceitar, mas como somos estimulados a mudar muito mais do que a nos aceitar, hoje quero focar na autoaceitação. Vivemos numa sociedade altamente competitiva e aprendemos a medir o nosso valor em comparação aos outros. Estamos sempre “devendo”: não somos suficientemente bem-sucedidos, atraentes, ricos, inteligentes, cultos, evoluídos etc. etc.  Não é de se espantar, então, que a tal autoaceitação pareça tão inatingível!

Mas, para quem deseja estar mais em paz consigo mesmo, aqui vão algumas dicas:

1. Conheça-se de verdade.

O autoconhecimento é o ponto de partida porque não podemos nos aceitar sem antes nos conhecer. Isso requer honestidade, introspecção, coragem e tempo. Pode ser impulsionado por terapia (especialmente aquelas que exigem esforço e nos convocam a ver nossas sombras), por relacionamentos significativos, por mudanças inesperadas e pela escrita, entre outras coisas.

2. Pratique a autocompaixão.

Não adianta se conhecer e ficar se autoflagelando com exigências, culpas, remorsos e outras coisas que aumentam o sofrimento e a sensação de que você precisa ser diferente para ser alguém digno de amor e respeito. A autocompaixão não é o equivalente a passar a mão na cabeça dos erros cometidos ou das áreas em que você quer e pode melhorar; pelo contrário, é um antídoto contra emoções negativas fortes (ódio, vergonha etc.), que acabam sugando nossa energia e não nos permitindo avançar nos nossos projetos.

3. Leia bons livros, veja bons filmes.

Histórias nos inspiram a encontrar novos caminhos e novas compreensões. Por isso, não são uma “perda de tempo”, sobretudo quando são capazes de nos levar para lugares, sentidos e sentimentos que não costumamos experimentar. Estou falando do tipo de arte que não representa uma fuga, mas um potencial (re)encontro com partes esquecidas ou dormentes de nossa imaginação. Recentemente, um filme que me tocou muito – e que tem tudo a ver com a autoaceitação – é O som do silêncio (Amazon Prime), sobre um baterista de heavy metal que perde a audição.

4. Abrace suas paixões.

O que faz o seu coração cantar? O que lhe move sem que você precise se esforçar muito? O que lhe traz alegria, propósito, conexão? Estar envolvido com nossas paixões proporciona uma sensação de entusiasmo que tem tudo a ver com o estado de viver no presente que é um dos pilares da autoaceitação. Passar tempo com algo que o coloque nesse estado é essencial.

5. Seja paciente (e persistente).

Assim como não aprendemos a nos criticar da noite para o dia, não vamos nos aceitar como num passe de mágica. O caminho até a autoaceitação é longo, árduo e parece não avançar muito rápido no início. É que nem aprender a surfar depois de adulto. Primeiro temos que entrar na água fria, aprender a nos equilibrar, pegar a onda e tentar não cair (e vamos cair muitas vezes). É um processo demorado e difícil, porém bonito demais, mesmo quando uma onda vem e nos derruba. Faz parte, é só subir na prancha de novo e esperar a nova onda.

5 de abril de 2021

O que é escrita criativa?

A “escrita criativa” se popularizou nos últimos tempos, mas será que todos nós temos a mesma compreensão do que é escrita criativa? Afinal, embora todos vamos concordar sobre a definição da palavra “escrita”, o adjetivo “criativa” é um tanto subjetivo.

A Wikipédia define escrita criativa como “toda a escrita literária (textos literários), nomeadamente poemas, contos, novelas, romances, textos dramáticos, guiões” (para quem não sabe – e eu não sabia – “guião” é “roteiro” em português de Portugal). Mas, voltando para a Wikipédia, preciso dizer que achei essa definição excessivamente estreita, a começar pelo fato de que exclui todo e qualquer texto de não ficção! Quer dizer, então, que o Yuval Noah Harari, quando escreveu o best-seller Sapiens, não estava escrevendo criativamente? Ou que os textos de jornalistas, publicitários e profissionais de marketing não são criativos?

Limitar o termo “escrita criativa” a obras de ficção não me parece muito interessante. Prefiro a generosidade da definição do jornalista e escritor Ronaldo Bressane. Para ele, escrita criativa é “tudo que é escrito de modo criativo, ou seja, nem técnico, nem copiado”. Sucinto, abrangente e certeiro. Essa definiça abre o campo das possibilidades e, em última instância, convida todos nós a sermos mais criativos.

Rótulos de xampu podem ser criativos (os leitores de chuveiro agradecem).

E-mails triviais podem ser criativos.

Bilhetes românticos podem ser criativos.

Não seria lindo se todos nós usássemos a escrita como veículo para expressar a singularidade dos nossos pensamentos e emoções? Se aprendessemos a escrever não apenas para informar, assimilar conteúdos e fazer combinados, mas também para criar conexões, aumentar nosso autoconhecimento e expressar o que há de mais precioso dentro de nós – nossa essência única?

Sei que sou suspeito. Eu não só vivo da palavra como fui salvo pela escrita, como explico no meu livro Coragem é Agir com o Coração.  Sou um eterno apaixonado pela escrita criativa e quero imbuir em todos essa mesma paixão.

A vida é muito bela e muito complexa para limitarmos nossos textos a objetivos utilitários; nossa mente é ampla e extraordinária demais para regurgitar apenas ideias copiadas. Quando todos nós – escritores e engenheiros, médicos e motoristas, advogados e acadêmicos, entre outros – assumirmos a criatividade de nossos textos, tenho certeza de que ler e escrever serão tarefas que faremos com muito mais prazer e autenticidade.

Se você gostou deste artigo, te convido a conhecer meu curso online Escrita e Autoconhecimento: A arte de se encontrar através da palavra. O curso é para quem quer se autoconhecer, se comunicar de forma mais autêntica, desenvolver o hábito de escrever e aprender a lidar melhor com as suas emoções.

22 de março de 2021

A diferença entre escrever bem e escrever mal

No meu curso Escrita e Autoconhecimento, dedico um bom tempo para alertar contra o crítico interior – aquela voz negativa que sempre parece querer ajudar, mas que acaba sabotando nosso planos, nos mantendo presos na nossa zona de conforto. Com frequência, as críticas chegam num volume tão ensurdecedor que nós acabamos cedendo: “Ok, ok, você está certo. É melhor eu não escrever essa história”. E aí ligamos o Netflix, nos distraímos e não produzimos aquilo que tanto sonhamos. Uma lástima.

Mas matar o crítico interior é um erro igualmente grave. Porque o nosso senso crítico tem uma importância enorme na segunda fase da criação de qualquer texto: a fase da edição. E isso vale para um email, uma apresentação, um artigo acadêmico, uma tese, uma crônica, um livro inteiro. É importantíssimo dedicar tempo e esforço para reler o que você escreveu, de preferência com a mente descansada. E, nessa hora, chame o crítico interior para participar. “Amigo, agora sim eu gostaria do seu input”.

Pergunte-se:

  • O texto está claro?
  • O meu objetivo com esse texto foi comprido? 
  • O que poderia melhorar nessa frase, nesse parágrafo, para tornar o texto ainda mais efetivo?
  • Faltou alguma coisa: informação, emoção, tato?

Escrever bem acontece em duas etapas: escrever e depois melhorar o que foi escrito. O crítico interior, que tanto nos atrapalha na primeira etapa, é primordial na segunda. Em seu Master Class ensinando a escrever thrillers, Dan Brown – autor de  O Código Da Vinci e outros best-sellers – diz que “a diferença entre bons e maus escritores é que bons escritores sabem quando escrevem mal”. Ou seja: até bons escritores escrevem mal de vez em quando. A diferença é que eles usam o seu senso crítico para melhorar.

15 de março de 2021

Como escrever o e-mail perfeito

Li recentemente no The New Yorker um artigo do escritor Cal Newport em que ele argumenta que os e-mails estão nos deixando profundamente infelizes. De acordo com ele – e apoiado por vários estudos e especialistas – os emails criam “um ciclo tortuoso que aumenta nossa quantidade de trabalho ao mesmo tempo em que frustra, por meio da distração constante, nossa capacidade de realizá-lo com eficácia”. Mais grave do que isso, no entanto, é que, segundo Newport, o e-mail é uma forma “desumana” de trabalhar em equipe.

Fiquei um tempão refletindo sobre isso: será que existe uma forma de tornar o e-mail mais humano - menos uma fonte de estresse e mais uma ferramenta de conexão, sem perder a praticidade? 

Aqui vão algumas coisas que eu pensei:

1. Pergunte se o email é mesmo necessário.

Emails são como embalagens: práticas, muitas vezes necessárias, mas inegavelmente poluentes. Então, vamos ser ecológicos - quero dizer, econômicos com o seu uso. Se for supérfluo, não escreva. 

2. Copie só quem realmente importa.

Pelos mesmos motivos citados acima, não mande um email para quem não precisa recebê-lo. 

3. Escolha a hora certa.

Toda forma de comunicação tem um texto e um subtexto. Quando um chefe envia um email a seus subordinados no domingo, às onze da noite, o subtexto é: “não existe folga do trabalho”. Uma mensagem assim, dependendo do ambiente de trabalho, pode ser muito desagradável. Se necessário, escreva, mas deixe para enviar na manhã seguinte.

4. Seja claro e objetivo.

Não é o momento de escrever textão. Procure ser o mais objetivo possível, sem ser frio, o que nos leva ao próximo ponto…

5. Seja simpático.

Claro que o tom depende do assunto, do destinatário e da área de atuação, mas seja o mais agradável possível. Lembre que suas palavras vão ser lidas por uma pessoa de carne e osso. Sugiro fechar os olhos, visualizar seu(s) destinatário(s) e colocar uma frase ali que possa ser lida com um sorriso. 

6. Não seja preguiçoso.

Esquecer de usar letras maiúsculas para começar a frase ou economizar na pontuação – ou, pior, deixar de assinar o seu nome no final – dá a impressão de que você não se importa nem com o básico da cordialidade. 

7. Tenha paciência.

Estamos todos sobrecarregados, com caixas de mensagens transbordando. Sejamos pacientes – tanto para ler e responder os nossos emails quanto para aguardar as respostas.

Foram essas as dicas que me surgiram, mas a ideia deste post é ser um ponto de partida para descobrirmos uma forma mais humana de nos comunicar por e-mail.  E aí, quais são as suas dicas para escrever o e-mail perfeito? 

14 de março de 2021

Toda tristeza é um filho

Um olhar triste nunca me afastou de ninguém. Impulsionado por uma sensibilidade que incansavelmente sussurrava no meu ouvido, sempre me aproximei dos que contavam histórias pelos olhares. Todos têm uma história para contar, uma canção que têm vergonha de se identificar ou um choro que esconderam no banheiro. Por maior que seja o embarque do sofrimento, nunca deveriam ter medo de contá-las ou ouví-las, pois, não importa quem tenha sido o vilão ou o mocinho, as histórias são o que são.

As tristezas acontecem, porém, nós as vestimos de formas diferentes. Toda tristeza pode ser uma armadura impenetrável ou uma veste bonita, um muro alto ou uma ponte florida. Elas surgem, pingam em nossas mãos e cabe a nós definir o que faremos com elas. São partes nossas, mas que não podem ditar o nosso olhar sob a vida, até porque carregar tristezas consigo não faz de ninguém uma pessoa triste.

Se existem marcas na pele, por que também não haveriam marcas na alma? Se separamos tempo para celebrar as alegrias, precisamos também separar tempo para chorar. Se fugimos das lágrimas, também fugimos dos aprendizados. E um sofrimento nunca pode ser um aprendizado em vão.

Precisamos ter algo que chora dentro de nós. Uma parte disforme que também precisa sair, respirar, nadar em si. Se você deixa as suas alegrias passearem ao sol, desfilarem frente aos desconhecidos, onde as tuas tristezas se encontram? Não é porque você não as considera tão belas que não precisem do mesmo olhar admirado que você tem das alegrias. Focar no porquê da tristeza ou julgá-la como indesejável é não aceitá-la como ela é. E toda tristeza é um filho que devemos amar, seja como ele for.

7 de março de 2021

Te olhar me acalma

Anos atrás, uma mulher, pela qual eu era completamente apaixonado, para não dizer enfeitiçado, me perguntou por que, em vários momentos, alguns deles estranhos e sem grandes explicações, eu a observava tanto, sempre com um olhar contemplativo e admirado. E, com o sorriso mais honesto que eu pude externar naquele momento, respondi: “Pois te olhar me acalma”.

Você já olhou para alguém e sentiu que o prazer de estar perto daquela pessoa não era exatamente a paixão ou a vontade de beijá-la loucamente em qualquer esquina, mas sim a sensação de paz que ela te transmitia? Como se tudo fosse possível e sereno com aquela pessoa, pois para todas as divergências havia conversas, para todos os medos havia uma mão firme, para todas as oscilações confusas havia abraços cheios de silêncio e amor.

Com ela eu sentia que podia dividir todos os meus anseios e que receberia de volta compreensão e carinho. Me sentia com poderes nunca antes imaginados, como se todos os meus defeitos e dúvidas fossem meros detalhes, e não problemas que eu insistia em sublinhar. Eu a olhava como se estivesse diante de um lindo pôr do sol, de uma enorme queda-d’água cujo barulho alivia os pensamentos, de um campo cheio de girassóis se agitando ao vento.

Ela me ensinou, mesmo sem dizer uma palavra, que se relacionar com uma pessoa que nos incendeia com discussões e inseguranças diárias, além de cansar, nos furta o brilho, o amor perene e a paciência. Por mais febril que o amor contido nessa relação seja, por mais que ele tenha se iniciado de uma maneira única e linda.

Depois de aprender com ela quão intenso – por mais que muitos achem que a calmaria e a intensidade são ideias antagônicas – e engrandecedor um amor calmo pode ser, deixei de desejar ser a grande paixão de alguém; estou preferindo ser a serenidade, o porto seguro, o trilhar suave, o navegar em dia de sol, o toque que transcende a pele e os padrões. Amar com calma é tão mais gostoso, tão mais saudável... E muitas vezes querer, insistentemente, ser o grande amor da vida de alguém, carrega consigo muito mais vestígios de ego do que propriamente de amor.

Assim a amei por anos, sempre fazendo-a recordar que ela fora a minha paz, mesmo quando ela brincava de sumir... mas tudo bem, olhar para ela me acalmava tanto...

1 de março de 2021

Por que a Inteligência Emocional é mais necessária do que nunca

Nos fim dos anos 1990, o jornalista Daniel Goleman popularizou o conceito da inteligência emocional, definida pelos psicólogos Peter Salovey e John D. Mayer como “a capacidade de perceber e expressar emoções, assimilás-la ao pensamento, compreender e raciocinar com elas, e saber regulá-las em si próprio e nos outros”. Goleman define o conceito como a união de cinco habilidades:

  1. Autoconhecimento: ter uma percepção aguçada das próprias emoções e sentimentos e do impacto que eles têm em você e nos outros;
  2. Autorregulação: saber administrar com os sentimentos de acordo à situação (ao invés de ser regido por eles);
  3. Competência social: cultivar bons relacionamentos;
  4. Empatia: reconhecer e levar em consideração as emoções e os sentimentos dos outros;
  5. Motivação: conectar-se com a motivação intrínseca.

Cinco anos atrás, o Fórum Ecônomico Mundial listou a inteligência emocional como uma das habilidades essenciais para 2020, em sexto lugar. Hoje, há um ano vivendo numa realidade de isolamento social, incertezas e falta de controle, eu diria que a inteligência emocional deveria estar entre as três mais importantes habilidades.

Sem autoconhecimento e autorregulação das nossas emoções, viramos presas fáceis da polarização e julgamentos que tornam a vida em sociedade cada dia mais pesada e desagradável.

Quem viu o documentário O dilema das redes (Netflix) sabe que os algoritmos nos conhecem tão bem que nos manipulam, despertando emoções fortes como raiva e repulsa, que por sua vez nos atrapalha a ter empatia e cultivar bons relacionamentos. Sem isso, ficamos isolados – sozinhos mesmo, ou restritos a uma tribo que pode, a qualquer momento, por qualquer deslize, nos “cancelar”. E, por fim, sem uma conexão com nossa motivação intrínseca, sem próposito, a vida perde a cor, a preguiça e a inação vencem.

Por isso, é mais importante do que nunca sair do carrossel de hábitos e atitudes que nos deixam emocionalmente anestesiados e, francamente, desconectados de nós mesmos e dos outros. 

Aqui vão três ideias para começar:

1. Conheça-se de verdade: na terapia, através da escrita, sendo radicalmente honesto e corajoso com si mesmo.

2. Escute mais, fale menos: aprenda a ficar confortável no silêncio, não interrompa o outro, demonstre mais curiosidade e menos julgamento.

3. Pause antes de agir: antes de retrucar ou reagir a algo, faça uma pausa. Pergunte-se: “o que está motivando minha atitude? Vai ajudar ou atrapalhar?”

Você concorda comigo que é urgente desenvolvermos e valorizarmos a Inteligência Emocional? Quais outras estratégias você sugere como ponto de partida?

28 de fevereiro de 2021

Há uma falta que carrego comigo

Há uma falta que carrego comigo. Uma falta que, quando não sei o que responder, digo ser dos amores que me magoaram, dos toques que constantemente me faltam, das ocupações que abraço como minhas para me sentir importante, ou do azar que sorrateiramente julgo estar pousando no meu quintal. Mesmo sem ter um quintal para chamar de meu.

Há uma falta em mim que preencho com prazeres momentâneos. Quando invento a fome, ansiando o passar do tempo, quando uso as redes sociais acreditando que estou me divertindo, quando assisto a filmes e séries que pouco a pouco me afundam no sofá, em um tédio eterno. Prazeres pontuais, que giram o ponteiro do relógio até a hora de dormir, mas nunca sustentam a felicidade do amanhã.

Há uma falta que escondo nas incessantes horas de trabalho, nas ideias que nunca sei se realmente são boas ou não, nas amizades que já deixaram de ser amizades há anos, nas janelas que pela manhã esqueço de abrir para o ar circular, nas cobranças e metas que crio antes de dormir, nas mensagens que ficaram sem respostas, nas palavras carinhosas que desejei ouvir da minha família.

Há uma falta que já fez o bem-estar dos outros me doer, que me fez ir embora de lugares porque quis chamar atenção e não funcionou, que me fez discutir sobre assuntos sobre os quais nem tenho conhecimento, mas fingi que tinha, que me fez relacionar com pessoas com energias que não ensamblam com a minha, mas forcei o encaixe, mesmo sabendo que, ao final da história, quem morreria seria eu.

Perdido entre boas e más recordações procurei em mim o espaço preenchido pela falta. Já o achei várias vezes, mas nunca aprendi a abraçar verdadeiramente um espaço que falta. Se ele falta, como se abraça? Abraçamos o vazio? Ou abraçamos a nós mesmos?

Atar a ponta da falta e da nossa necessidade de preenchê-la é uma fantasia que gostamos de alimentar. A gente tenta preencher a falta para ocupar o tempo que teríamos que abraçar nós mesmos. E nunca é fácil ter que se abraçar, ainda mais quando sempre há uma parte que falta.

14 de fevereiro de 2021

Em busca de um amor brisa

Já tive amores loucos. Efêmeros. Daqueles que até a chuva abençoou. Na verdade, nem sei se todos foram tão amores... Será que posso chamar de amor os amores que nem foram tão amores assim? Na verdade, sempre que possível, confundo paixões com amores, mesmo tendo ciência total da definição de cada um. É que existem paixões que se manifestam de maneira tão grande dentro de mim, que não haveria possibilidades terrestres ou oceânicas de elas não serem amores.

Já fui ansiedade no amor, na vida, nos sonhos. Sempre quis viver todas as aventuras possíveis! Achei, burramente, que teria que viver em ritmo frenético tudo o que pudesse, até a juventude se esvair. Caso contrário, não teria feito jus à vida que tive. Ah, como a maturidade é gostosa! Ah, como a maturidade faz o simples ser um eterno verão! Ah, como a maturidade é uma linda amizade de anos com alguém que você confia.

Mas o tempo passa, a gente aquieta o coração e observa como existem alguns prazeres que somente a calmaria pode nos proporcionar. Um café no sítio, um beijo na estrada com os vidros abertos, um filme na sexta à noite, e por que não no sábado também? Os amigos dirão que você é velho e que, daqui a pouco, seus joelhos não aguentarão mais sair de casa, mas deixe que os amigos falem, deixe que eles tenham carinho ou inveja, saudade ou preguiça de convidar você. A calmaria de um amor é assim: gera desconforto a quem não tem.

Eu não posso me furtar do quão genuíno é o que vivo. Hoje, procuro tranquilidade, tanto no trabalho quanto no amor. Na verdade, procuro um amor repleto de coisas simples; elas são o segredo da vida. Não espero muito mais que compreensão no olhar, e sorrisos de ombros leves. Quero serenar na praia, no campo, no jardim de uma casa que ainda não tenho, mas já imagino como será. É louco, eu sei, mas sempre tive essa utopia de imaginar minha futura casa. Mesmo sendo um sonho, dito por vários, “feminino”, confesso que fico imaginando os detalhes, os abajures, o jardim, os cachorros, e, por incrível que pareça, até gostaria de ter uma horta. Talvez eu seja caseiro, ou estranho demais, vai saber...

Então, não desejo aviões, sejam eles mulheres ou obras da engenharia. Só alguém que olhe devagar para mim. Gosto de paixões assim, simples por serem o que são. Esse é o segredo da intimidade: ser leve para amar, mas, principalmente, leve para saber se deixar ser amado. Pois, com certeza, das coisas que podem ser simples, eu escolho o amor.

7 de fevereiro de 2021

É dor ou tristeza?

Eu tenho comigo muitas tristezas, que um dia já foram dores. Essas tristezas têm suas razões e seus responsáveis – na maioria das vezes, eu mesmo. Grande parte delas se refere a situações em que tive de dizer adeus sem estar preparado. E há como se preparar para o adeus? Honestamente, eu acho que não; ensaiar o adeus me parece impossível e desnecessário, porque a cada vez é uma nova plateia, uma nova cena, e – ainda bem! – não há tempo de decorar as falas do nosso personagem (até porque seria ridículo termos frases prontas para um momento que tanto pede sensibilidade).

Bem, como eu disse, o que era dor hoje é somente tristeza. Qual é a diferença entre elas? Para mim, a dor é o primeiro impacto que se instala em razão de um trauma. A dor lateja, grita, pede socorro, produz um desespero difícil de carregar. Alguns desses traumas são maiores, outros são menores, mas todos são significativos. Cada pessoa recebe o golpe de uma forma, e não se pode relativizar a dor de ninguém. Tentar mensurar a dor alheia, como se houvesse uma régua dos sentimentos, é de uma ignorância sem fim. É preciso sempre respeitar a singularidade de quem é tirado pela dor para dançar.

Já a tristeza é o sentimento que vem após a dor; depois de o torpor ter abandonado o seu corpo e aberto espaço para a reflexão. A tristeza é a conversa, a calmaria melancólica após a turbulência, é a aceitação daquilo que passou. Você está triste, sabe disso, mas não está em desespero.

Se pudéssemos dar forma humana para a dor e a tristeza, a primeira seria uma criança abrindo o berreiro em busca de atenção, já a segunda, um senhor sentado na poltrona de sua casa conversando sobre a vida e dando conselhos importantes com base em suas experiências.

Tanto a dor quanto a tristeza têm sua importância, e não devemos fugir delas. De fato, devemos dar-lhes a devida atenção. Com o tempo, a dor vira uma tristeza que nos habitará para sempre. E quando, de repente, essa tristeza surgir, querendo ganhar força, doe um pouco do seu tempo, converse com ela, pergunte o que quer e o que você pode fazer para ajudá-la a ficar em paz; ela, como nós, é carente e precisa de longas conversas para se sentir bem. E, com o tempo, vocês se tornarão amigos, já que ela sempre será uma companheira fiel. Principalmente nos dias de chuva e companhia rara.

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Está com dificuldade de seguir em frente depois de uma relação que havia muito sentimento?

Quer dar a volta por cima e resgatar o seu bem-estar emocional?

Fred Elboni 2022 — Todos os direitos reservados

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